Publicado em 27 de julho de 2023 por Suporte Agencia
REFORMA TRIBUTÁRIA – PEC 45 É SÓ A PONTA DO “ICEBERG”
A aprovação da PEC 45 pela Câmara dos Deputados dia 07/07/2023, em que pese ter sido um grande passo para reformulação do sistema tributário em âmbito nacional, trouxe também diversas incertezas e mostra que o cenário é bem mais complexo do que apresentado.
Sem adentrar no mérito de que o país necessita urgente de uma reforma, principalmente no tocante a desburocratização do sistema atual, a reformulação necessita de estudos técnicos para avaliar os impactos que a mudança trará, e assim cumprir com seu objetivo, qual seja, justiça fiscal com otimização da arrecadação.
A PEC 45 em sua primeira fase, na teoria, trará mudança significativas na tributação do consumo com a extinção de tributos, simplificação do sistema arrecadatório e aplicação correta da não cumulatividade tributária, o que permitirá ao contribuinte saber exatamente quanto desembolsará na aquisição de produtos e serviços, além de acabar com a incidência de “tributo sobre tributo”.
O texto prevê a criação de uma tributação no modelo IVA (Imposto sobre Valor Agregado) de forma dual e bipartida[i], utilizado em diversos países do mundo, a qual considera o valor destacado da operação de forma direta e não-cumulativa, ou seja, determina como base de cálculo o efetivo valor da operação e abatendo-se o recolhimento de etapas anteriores.
Tal modelo, além de simplificar o método de tributação ao contribuinte, que saberá efetivamente qual valor será desembolsado, otimiza também o processo arrecadatório incidente sobre o consumo por parte dos entes federativos. Vale ressaltar que a tributação sobre o consumo representa [ii]14,1% do PIB nacional.
Assim, os tributos federais PIS, COFINS e IPI serão unificados e substituídos pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), sendo mantida a competência no âmbito federal para fiscalização e arrecadação.
Os impostos ICMS e ISS, que atualmente são de competência estadual e municipal, respectivamente, serão unificados e substituídos pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), cuja fiscalização e arrecadação será realizada de forma compartilhada entre União e demais entes federativos, com a criação de um [iii]Conselho Federativo, para fins de harmonizar normas, interpretações e procedimentos relativos aos tributos unificados.
Quanto às alíquotas, a previsão é de que haverá uma incidência de tributação sobre o consumo de 25%, sendo que a média dos países que adotam tal sistema e de 20,5%, segundo dados da OCDE[iv].
Assim, ainda que o texto da PEC/45 trate a primeiro momento apenas da tributação sobre o consumo, não houve a devida distinção sobre a incidência tributária sobre produtos, leia-se, circulação de mercadorias, da incidência sobre prestação de serviços.
O tratamento de tais negócios jurídicos devem ser encarados de forma distinta, pois não há como tributar da mesma forma as operações de industrialização e comercialização de produtos, da prestação de serviços que demandem trabalho estritamente pessoal, técnico e intelectual.
Uma sociedade estruturada para prestação de serviços é totalmente distinta de uma sociedade empresária, tão logo a legislação deverá prever tratamento diferenciado no modelo de tributação, concessão de créditos e incentivos fiscais, sob pena de desestimular a contratação de mão de obra e queda do PIB nacional, já que o setor representa quase 70%[v] do produzido no país.
Além disto, a tributação sobre a renda é o principal ponto a ser observado na busca de justiça fiscal, e até para fomentar o consumo no país, pois no cenário atual a população de baixa renda despende muito mais recursos para suprir suas necessidades básicas[vi].
Muitos pontos que deveriam ter sido discutidos no texto base da PEC/45, principalmente nas questões sobre competência tributária, tratamento diferenciado de setores, além da forma de arrecadação foram destinados para regulamentação posterior através de legislação complementar, o que traz uma enorme insegurança jurídica, além do risco de causar aumento do contencioso tributário, assim como as intermináveis discussões existentes nos últimos anos no cenário atual.
Assim, a PEC/45 é apenas a ponta do “iceberg” na busca de um sistema tributário justo e eficiente, a qual deve ser amplamente discutido de forma técnica quanto aos seus impactos sobre setores de produção e aos contribuintes.
[i] https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9004141&ts=1629943171144&disposition=inline
[ii] https://sidra.ibge.gov.br/tabela/1846#/n1/all/v/all/p/-1/c11255/90687,90691,90696,90705,90706,90707,93404,93405,93406,93407,93408,102880/l/v,,c11255+t+p/resultado
[iii] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2196833
[iv] https://www.oecd.org/tax/tax-global/BRAZIL_PT_country%20note_final.pdf
[v] https://brasilemsintese.ibge.gov.br/servicos.html
[vi] https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2020-10/familias-mais-pobre-destinam-26-da-renda-para-compra-de-alimentos
Thiago Santana Lira – Advogado Sócio em Barroso Advogados Associados, MBA em Gestão Tributária, Contencioso e Consultivo Tributário
Quer saber mais sobre o assunto? Ou tirar suas dúvidas com um especialista? Entre em contato conosco e agende uma reunião.