Publicado em 1 de julho de 2025 por Suporte Agencia
PEJOTIZAÇÃO – REFLEXOS TRIBUTÁRIOS DA EVASÃO FISCAL E A JURISPRUDÊNCIA DO CARF
Amplamente praticada na contratação de mão-de-obra, o instituto da “pejotização” traz reflexos não só na seara trabalhista, como também na tributária, e impacta diretamente na atividade empresarial.
O Supremo Tribunal Federal – STF, em [i]sede de julgamento por repercussão geral suspendeu em âmbito nacional, a licitude da contratação de mão-de-obra autônoma através de pessoa jurídica, popularmente conhecida como “pejotização.
Na seara trabalhista, a linha tênue a ser observada está descrita no [ii]artigo 3º CLT, a qual a contratação de mão-de-obra com preenchimento dos requisitos de pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade, será considerado como empregado, devendo tal negócio jurídico ser regido pelas regras celetistas.
Uma vez caracterizado o vínculo trabalhista, também surge a incidência de tributos no negócio jurídico a serem recolhidos pelo empregador/tomador na qualidade de contratante, ou ainda, como responsável pela retenção sobre os rendimentos pagos e repasse aos cofres públicos, como imposto de renda, contribuições sociais e previdenciárias.
Não só a incidência dos tributos previstos ao negócio jurídico, uma vez verificada a estruturação da contratação no intuito de impedir o fato gerador tributário, poderá ser considerada como fraudulenta pela fiscalização, com aplicação de multas elevadas que podem, inclusive, inviabilizar o negócio empresarial.
No âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscal – CARF, o entendimento é que, [iii]“(…) quando o serviço for executado de maneira que se caracterize a relação de emprego entre o prestador e o tomador de tal serviço, estaremos diante de um contrato de emprego, nos termos do art. 3° da CLT, o que, por força do art. 9º do mesmo diploma legal, torna nulos todos os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, fraudar ou impedir a constatação da relação de emprego advinda de tal realidade contratual, como, por exemplo, a contratação via pessoa jurídica.”
No caso em tela, a pessoa física fiscalizada estava inserida no quadro executivo da pessoa jurídica tomadora, sendo que parte dos seus rendimentos eram recebidos por pessoa jurídica constituída para prestação de serviços de consultoria.
Ou seja, segundo a fiscalização, a prestação de serviços exercida com pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade estava sendo executada por pessoa jurídica, com intuito único de burlar a legislação trabalhista para afastar o vínculo empregatício, e tributária no recolhimento dos tributos incidentes.
Assim, além da glosa do imposto de renda recolhido pela pessoa jurídica prestadora de serviços na declaração de ajuste pelo sócio/pessoa física, houve ainda a aplicação de multa de ofício no porcentual 150%, por ato fraudulento do contribuinte.
No âmbito do Direito Tributário, a interpretação da norma para fins de incidência tributária, necessariamente deverá preceder de lei em sentido estrito, bem como, a presunção de boa-fé do contribuinte, cabendo prova ao contrário da administração pública para aplicação de norma sancionadora.
Neste sentido, o [iv]artigo 118 do CTN dispõe que a administração pública interpretará a norma tributária de acordo com a validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos.
Conforme explica o [v]Profº Roque Antônio Carrazza, “(…) simulação é, em apertada síntese, a divergência entre a vontade e a declaração, fruto de acordo celebrado com o fito de enganar terceiros.”
O ato jurídico deverá estar pautado em elementos fáticos que o definam como válidos nos termos do Artigo 170 da Constituição Federal, ou seja, deverá ter seu propósito negocial visando otimizar o exercício da atividade empresarial de forma substancial.
Neste sentido nos ensina o doutrinador [vi]MARCO AURÉLIO GRECO que “(…)o conceito de simulação deve deixar de ser visto como um vício da vontade e passar a ser encarado como um vício de causa, na medida em que a causa, vista dessa perspectiva, é que deve servir de critério para aferir a ocorrência de simulação.”
Com isso, qualquer ato empresarial deverá observar não só a legislação vigente, como também os princípios de boa-fé objetiva, para que a fiscalização não entenda que a operação esteja eivada de vícios para fins de simulação com objetivo de evasão fiscal.
A evasão fiscal, em suma, é a prática simulada e dolosa de qualquer ato do contribuinte com intuito de inibir a incidência tributária, ainda que parcial, na operação.
A contrário sensu, a elisão fiscal é a execução de atos lícitos por parte do contribuinte para fins otimizar sua atividade empresarial, como diminuição no tempo e custo do fluxo logístico, capacitação de mão de obra por meio de benefícios fiscais, dentre outros, que consequentemente alcançará uma economia tributária de forma consequente.
Com base nestes princípios, o julgamento no âmbito do CARF concluiu pela fraude praticada pelo contribuinte, ao pontuar o julgador que:
[vii]“(…) nos autos, foi evidenciado que o recorrente agiu, de forma premeditada e deliberada, para dissimular a verdadeira natureza dos rendimentos por ele recebidos. Foi devidamente demonstrado, que o autuado, de forma fraudulenta, simulou a existência de serviços prestados por pessoa jurídica com o intuito de acobertar o auferimento de rendimentos tributáveis, passando a declará-los como recebimento de lucros isentos, oriundos de sua empresa de fachada (Yellowstone), que prestava serviços a outra empresa, onde o mesmo autuado exercia a função de diretor presidente. Constatada assim, a prática de ação dolosa, tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, com vistas à redução do montante de tributo devido.”
Posteriormente, a multa de ofício aplicada no porcentual de 150%, foi reduzida para 100%, com base no advento da Lei nº 14.689/2023, que incluiu o inciso VI ao § 1º, do [viii]art. 44, da Lei nº 9.430/1996.
Por fim, conclui-se que, a jurisprudência administrativa liga o alerta de que a “pejotização” deve ser analisada de forma criteriosa e multidisciplinar, não só na contratação de mão-de-obra, como também da reorganização executiva da entidade, visando assim evitar a ocorrência de atos fraudulentos que refletem diretamente na atividade empresarial.
[i] https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-suspende-processos-em-todo-o-pais-sobre-licitude-de-contratos-de-prestacao-de-servicos/
[ii] Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
[iii] CARF – 11020.722943/2017-21 – Primeira Turma Ordinária da Primeira Câmara da Segunda Seção
[iv] Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se: I – da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;
[v] CARRAZZA, Roque Antônio, Curso de Direito Constitucional Tributário, Ed. Malheiros, 2021
[vi] 28. GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. 3 ed. São Paulo: Dialética, 2011.
[vii] CARF – 11020.722943/2017-21 – Primeira Turma Ordinária da Primeira Câmara da Segunda Seção
[viii] § 1º O percentual de multa de que trata o inciso I do caput deste artigo será majorado nos casos previstos nos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, independentemente de outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis, e passará a ser de: (…) VI – 100% (cem por cento) sobre a totalidade ou a diferença de imposto ou de contribuição objeto do lançamento de ofício;
Thiago Santana Lira – Advogado Sócio em Barroso Advogados Associados, MBA em Gestão Tributária, Contencioso e Consultivo Tributário
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